Peguei este texto no site coxanautas e sinceramente achei excelente, o texto é de uma torcedora do Rosário Central da Argentina
"O sentimento de amor pelo seu clube de coração transcende as fronteiras e culturas ao redor do mundo. A crônica abaixo, escrita por uma torcedora do Rosário Central da Argentina, demonstra o quanto o futebol é capaz de despertar emoções parecidas em toda sorte de pessoas, independente de gênero, etnia, credo e classe social. Inclusive com a tradicional tendência ao exagero e à euforia desenfreada que só um torcedor fiel é capaz de entender.
A 13ª rodada do Campeonato Argentino - 29 de outubro de 2006
A véspera
Segunda-feira 23 de outubro de 2006, Rosário acorda e se prepara para uma nova semana, mas não é uma segunda-feira como todas as outras.Algo diferente se percebe: é a semana do clássico, aproxima-se o dia tão esperado. Ambos os lados vêm de uma rodada pobre, de um campeonato pobre, inclusive na pontuação (ambas as equipes têm a mesma quantidade de pontos, estão no meio da tabela, ambas alternam bons e maus resultados). O fato é que a ninguém importa muito esses detalhes, pois se sabe que o clássico é uma partida diferente, mesmo que o jogo valha três pontos como outro qualquer.
E assim arrancamos, cada um defendendo o seu, e as especulações começam. Os torcedores armam as equipes, táticas e estratégias, somos todos técnicos. Em Rosário não se fala de outra coisa, qualquer noticia, por mais importante que seja, passa despercebida se não estiver relacionada ao clássico. A imprensa enche suas páginas de jornais com futebol. Nas escolas e escritórios este é o único assunto e nas ruas só se vêm os acessórios de cada equipe.
Os dias passam e as declarações começam a fazer eco entre as pessoas. Ninguém pensa em falar outra coisa que não seja sobre o jogo. Começam os preparativos, e os amigos só falam sobre “quem vai comprar os ingressos” ou “como nos organizamos para ir para o 'Gigante'.” (NE.: Gigante de Arroito, como é carinhosamente chamado pela torcida do Central o estádio do clube).
Desde o começo do campeonato esperávamos o sorteio da tabela para ver quando seria. Quando saiu a publicação dos jogos, ficou definido que o clássico de Rosário seria jogado na 13ª rodada e no dia 29 de outubro. Um ano atrás foi dia 29, mas de agosto, que o Central (Rosário Central) eliminava o timinho (Newell's Old Boys) da Copa Sul-Americana com um gol do Germán “Pirulo” Rivarola. Aquele foi um dia histórico. Seria um sinal de que também num dia 29 se jogaria o clássico? Seria talvez outro sinal que o jogo ocorreria na 13ª rodada, igual ao número da camiseta de quem os havia “matado” naquela oportunidade? Ninguém sabia, tínhamos somente que esperar para comprovar.
Na sexta-feira os nervos já estavam à flor da pele. Não de medo, mas uma sensação estranha que ninguém pode explicar, que acontece com cada um antes de um clássico. Uma mistura de ansiedade e sossego. O sábado começava com o alerta meteorológico e ninguém se importava muito, pois a única preocupação era se poderia haver o jogo e que os jogadores tivessem condições de entrar no gramado.
Sábado à noite a chuva era torrencial... e não parava. Tinha de dormir para estar bem descansada para o jogo, mas quem consegue dormir? Não era fácil. Na cabeça giravam todos os sucessos e insucessos dos clássicos passados, que se misturavam em imagens, dificultando o sono. E assim passavam as horas.
E o domingo amanheceu. Chegou o dia, a chuva havia diminuído e isso indicava que a partida seria jogada. Começamos a caminhar, cada um com seus nervos à mostra. O jornal estava ali, mas apenas o folheávamos para ver se teria alguma novidade da equipe que jogaria. Não estava definido ainda, somente saberíamos no gramado
.Tínhamos de chegar cedo, pois assim parece que nos acalmávamos com mais facilidade, porque quando a pessoa chega ao “Gigante”, as coisas mudam. É como se começasse um novo dia. Já nas imediações se observava gente chegando de todas as maneiras possíveis, como se todos os caminhos levassem ao estádio. Todos procuravam não cruzar com os rivais, ou sequer vê-los chegar. Chegamos ao estádio, cada um com suas rezas, amuletos, mas com um mesmo objetivo em mente: vencer, custe o que custar, apoiando até o final.
O céu começava a se abrir e, já acomodados nos lugares, mesmo faltando algumas horas, a festa já se fazia sentir. Os minutos passavam lentamente, como os dias da semana que havia começado dia 23. As pessoas chegavam ao estádio e iam se acomodando em seus lugares. O estádio acompanhava o ritmo da bateria, exceto, logicamente, a parte dos visitantes, que era mais visitante do que nunca e não entendia como a festa começava a ser vivida pelo outro lado.
Tudo pronto, o estádio cheio, papéis picados e bexigas, a cor e o calor que se sentia era algo indescritível. As músicas não paravam, o outro lado não se escutava, pareciam mexer-se como querendo falar alguma coisa, mas nada se escutava, talvez um pedido de piedade. O time entrou em campo e o “Gigante” explodiu num só grito. Os jogadores já sabiam como seria, sobretudo, porque a maioria deles, na sua época de infância e adolescência já haviam vivido isto na arquibancada. Aparece a outra equipe e, bom, a vaia foi ensurdecedora. Eles estavam um pouco assustados, pois na equipe rival a maioria nunca sentou na arquibancada no passado, por isso, para eles não era tão compreensível quanto para os nossos. Isso nos dava mais confiança, pois sabíamos que nossos jogadores nos representavam, que dariam a vida em qualquer jogada. E aquilo aumentava nossa fé em um resultado favorável.
O grande duelo
Agora sim: todos os preparativos haviam passado, o grande momento chegou, as equipes, cada uma em seu lado, o melhor árbitro do mundo, ou pelo menos quem apitou a final do último mundial, estava ali, no meio de campo, acompanhado por seus assistentes... e é dado o apito inicial... vamos ao jogo!
Um pouco de distração no começo do jogo fez aparecer nosso goleiro que tinha sido questionado durante a semana. O apoio surgiu de todos os cantos, “esta tarde, custe o que custe, esta tarde temos que ganhar...” E assim a equipe se firmou, os jogadores impuseram seu jogo e os “convidados” se desorientaram com os gritos ensurdecedores que vinham da arquibancada. Era como um “bafo na nuca”, constante, sem parar, e então o Central fez-se gigante em sua casa e de imediato, Wanchope, aquele jogador de que tanto se falava, que estaria machucado e teria vindo da Costa Rica somente para ficar com o dinheiro dos investidores, desorientou os zagueiros, fez um lançamento surpreendente para o grande Chacho Coudet, tão odiado pelos rivais pelo amor que demonstra ao Central e seus torcedores e que há cerca de dois meses não jogava por uma lesão, entrou sozinho e fuzilou o “grande” goleiro paraguaio que eles dizem ter.
E ali estávamos todos nós, os torcedores, aos pés de Chaco, numa festa louca e até na emoção que sentiu. Que começo, que festa, que euforia!!! Mas recém eram jogados 18 minutos e logo a euforia foi substituída pela cautela. Contrariando esse sentimento, o time do Central fazia o adversário dançar, toque a toque. Meia dúzia de jogadas desperdiçadas e o segundo gol não chegava. ”Mais um” se escutava na arquibancada e, no embalo do “Olé!” os jogadores faziam jogadas maravilhosas, até que novamente Chaco, ele mesmo, chuta um “foguete” de fora da área que desconcerta o goleiro, que rebate a bola para a antecipação de Wanchope, que escora para as redes: 2 a 0, festa do jogador que beija a camisa do clube.
Que fantástico, já estávamos com uma diferença de dois gols, ninguém sabia mais como comemorar! A alegria era imensa!É dada a nova saída de bola ao som de “siga o baile, siga o baile”.O Central jogava impiedosamente até que um jovem de 20 anos, numa arrancada envolvente, coloca a bola na frente e faz com que dois zagueiros adversários se batam, se enrolem, e fica sozinho na frente do goleiro. O chute forte morre no fundo da rede e deixa o estádio numa loucura total! O que mais podemos pedir, 3x0 e onze jogadores que não sabiam o que estavam jogando? Festa em todos os lugares do estádio, em todos os lugares do mundo, com as rádios em suas casas, com as televisões nos bares, enfim, o mundo era azul e amarelo! Que descontrole, que euforia! Até o céu era azul e amarelo.
Que lindo! Que festa!Fim do primeiro tempo. Estávamos fazendo eles dançarem! Partida liquidada para alguns, mas ainda faltava um tempo e tínhamos que jogar...Começa o segundo tempo. O Central entra tranqüilo e dá um pouco de espaço para o adversário rubro-negro. “Bom meninos, deixamos eles fazerem um gol e assim não parece que eles estão mortos.” Bom, e assim fizeram, mas o que importa? O Central tinha o controle de tudo. Jogadas que passavam perto do gol do adversário, bolas no travessão... Até que uma falta fora da área é cometida e o assistente se engana e marca pênalti para o Central.
Que lástima esse engano, não? Todos nos olhávamos... quem vai bater? O grande Kily havia perdido um pênalti na rodada passada contra o River Plate, mas o que importa? Este é um jogo diferente e Kily merece seu gol para fechar e decretar outra vitória histórica. E assim foi, ele pegou a bola e fulminou o goleiro paraguaio para que a loucura fosse total! Chegamos a quatro e agora? Irão embora esses menininhos? Ou ficarão?Bom, o resto é comédia. Confusões entre os visitantes, jogadores expulsos, outros queriam ser expulsos também, mas o melhor árbitro do mundo não deixou. Ao apito final, o descontrole total.
Torcedores convertidos em jogadores festejando em um abraço comum com toda torcida. Festa total e os “peitos frios” (NE.: apelido dos torcedores do Newell's, por sua frieza) correndo a seus esconderijos, para permanecerem ali alguns dias, porque depois disto, não poderiam sair mais...Comemorações nas ruas. Buzinas, bandeiras, músicas e a felicidade completa havia chegado: havíamos esmagado os “pingüins” em uma partida espetacular.A semana seguinte todos sabíamos como seria.
A cidade que viu nascer a bandeira nacional agora estava coberta com uma única combinação: o azul e o amarelo, as cores da equipe grande da cidade, aliás, da única equipe, o Rosário Central, porque eles estão realmente mortos, ainda que não acreditem. E repetindo o que disse o grande Chaco Coudet, “agora sim, senhores, a cidade está em ordem”.
Carolina Angelome, autora do texto, é torcedora do Rosário Central da Argentina 'canallona de alma'.
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
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